quinta-feira, 23 de setembro de 2010

As Janelas de Veneza


Sempre me atraíram imenso as janelas. Pela forma arquitectónica, pelas portadas, pela ausência de decoração ou, pelo contrário, pelo excesso de elementos decorativos, vasos, flores, cortinas. Sempre me encantaram pelos mistérios que guardam, pelo que mostram e escondem, pelos sons que deixam escapar, pelas músicas, pelos silêncios. São verdadeiros olhos da alma humana de quem as habita.
Em Veneza, a proximidade da água e a humidade do ar emprestam cores e sombras únicas aos edifícios. Nos múltiplos palacetes, os vidros das janelas reflectem as transparências e movimentos das águas, a luminosidade do sol e espelham diferentes tons, desde o azul, passando pelo verde, o castanho barrento ou o cinzento chumbo. De cada vez que se passa, no vaporetto e se observam os edifícios e as janelas, se descobrem jogos diferentes de luz e sombra.
Já tinha experimentado esta sensação mas, desta vez, foi mais forte. Fiz várias vezes, a diferentes horas do dia, o mesmo percurso e pude constatar essa diversidade. Olhando as janelas de Veneza descobrem-se as colunas da arquitectura grega, as janelas das catedrais góticas francesas, esguias e com vitrais, as de influência árabe, as sacadas floridas que recordam as janelas da Andaluzia, um nunca acabar de estilos que se equilibram numa beleza rara e romântica.

Olhando as janelas de Veneza somos levados a viajar no tempo e imaginar os mercadores que a esta cidade/porto chegavam carregados de mercadorias, que trocavam por tantos outros produtos antes de rumarem às suas terras de origem. Veneza, as suas águas e todo um quotidiano, que se desenvolve nos canais e na laguna, tornam bem presente esse passado marítimo que lemos em tantos relatos de viagens.
Depois, já mais para o interior, quando penetramos e nos perdemos pelo labirinto de ruas e ruelas, já encontramos janelas mais pequenas, mais simples e modestas mas sempre muito importantes no conjunto das casas. Abundam varandas, as floreiras, cheias de gerânios, malvas e sardinheiras. Vêem-se muitas roupas lavadas a secar em estendais que vão de um prédio ao outro e em que quase sempre encontrei uma harmonia de cor espantosa, como se tudo fosse escolhido para ser belo.
Contrastando com este bom gosto, aparecem as marcas do tempo na corrosão das paredes exteriores, algumas mesmo muito degradadas. Só muito pontualmente encontrei obras de recuperação e restauro. Fiquei com a sensação de que essas marcas de tempo e história já fazem parte integrante da beleza da cidade. Mas interrogo-me se, mais tarde ou mais cedo, a cidade não irá ressentir-se desse aparente abandono? Não encontrei resposta para esta minha inquietação e todos os que me viam fotografar esses aspectos me questionavam sobre a razão das minhas escolhas. Como se apenas os canais e as gôndolas fossem dignos do nosso interesse.
Por ser uma cidade sem carros, existe menos ruído e menos poluição. Tem um pavimento excelente, sem passeios. Pode-se percorrer a cidade a pé, com bastante segurança e olhar para um lado e outro, apreciando os magníficos edifícios e admirando esse reflexo único das águas nas janelas de Veneza.


4 comentários:

Anónimo disse...

Tb gosto muito de janelas.
Janelas e candeeiros de rua!
Lisboa tem-nos mt lindos.
Mais uma imagens dessa mágica Veneza,num texto teu.
Beijo.
isa.

Rosa dos Ventos disse...

Lindas fotos!

Abraço

goiaba disse...

Gostei das fotos mas gostei sobretudo do texto. Dá para perceber o encantamento. Obrigada.
bjinho

peonia disse...

Texto vivo e colorido que reflecte bem a sensibilidade da Autora.Parabéns!

As janelas traduzem a história de um local. E isso fica patente no texto e nas fotos: um retrato do intercâmbio cultural que girava em torno de Veneza...